© Klaus Nather
“Para a comunidade africana, aquilo não era um monumento mas sim um memorial da vergonha.”
Lembro-me, sem dúvida em primeiro lugar, do Museu de Etnologia, agora chamado Museum am Rothenbaum – Culturas e Artes do Mundo (Museum am Rothenbaum – Kulturen und Künste der Welt). Além disso, ocorre-me a Filarmonia do Elba (Elbphilharmonie) e, evidentemente, o chamado “Parque Tanzânia” („Tansania-Park“) e, claro, o Jardim Zoológico Hagenbeck. Devo dizer que escolhi Hamburgo para viver e que só cheguei aqui em 2009. Ainda me lembro dos artigos de jornal sobre os protestos contra a estátua de Schimmelmann em Wandsbek [1]. Foi assim que tomei consciência dos locais que continuam a lembrar o período colonial. E fiquei estupefacta com os protestos da comunidade africana e com as suas ações.
Cresci em Bornheim, na Renânia do Norte-Vestefália, e em Baden-Baden (Baden-Württemberg), e ver que os negros se unem num protesto foi uma experiência que me marcou. Isso levou-me a querer saber mais sobre a história colonial, porque até então pouco me tinha interessado pelos lugares da memória colonial. Constatei até que ponto é importante participar nesse processo. Em 2013, a exposição freedom roads! [2] demonstrou como estamos rodeados de lugares coloniais e como é urgente trabalharmos este tema.
Trata-se da estátua de Schimmelmann, em Wandsbek. Prestou-se aí homenagem a um dos maiores traficantes de escravos. Para a comunidade africana aquilo não era um monumento mas um memorial da vergonha. Que esse busto tenha sido colocado de novo num lugar tão proeminente, comprovou até que ponto se tenta desdramatizar o comércio de pessoas africanas escravizadas. Comprova que ainda não se trabalhou esta questão.
Como eu era nova em Hamburgo e ainda não conhecia a comunidade afro-germânica, fiquei positivamente impressionada por um tal protesto ser possível. Acho corajoso e extraordinário que as pessoas se juntem para exigir:
“Acho corajoso e extraordinário que as pessoas se juntem para exigir: 'A estátua tem de desaparecer!'”
O facto de as pessoas de cor se terem unido para defender uma ideia tornou a minha mudança para Hamburgo muito aprazível. Tinha uma boa sensação e vi que aqui há uma reflexão e um movimento ativo que é tolerado.
O MARKK, ou seja, o Museu de Etnologia – só o nome já me parece inconcebível, e ainda por cima aquele lugar com o antigo átrio de entrada e todos aqueles nomes. A arquitetura é exatamente a mesma. Conservaram-se os sítios, como se a História não tivesse evoluído. Para mim, sempre ficou claro que não me posso inserir naquele lugar, por exemplo organizando iniciativas ou participando nelas. Este lugar precisa de uma reflexão drástica. A arquitetura é de tal forma marcante que, quando entro naquele edifício, tenho à frente dos olhos imagens concretas de desumanização.
E houve alguns formatos que se mantiveram, por exemplo a “exibição dos índios”. Mas vê-se mudança. Com a nova direção há um repensar das coisas. Em 2018 iniciei um projeto no museu. No enquadramento da exposição Flow of Forms concebi um programa mais vasto, uma conversa com o título “The Politics of African Fashion“.
Penso que a transparência é muito importante. Quando ainda não se conhece bem a cidade, não se apanham imediatamente as correlações. São precisas placas que as contextualizem de forma clara.
As placas deviam ser feitas pela comunidade africana, ou seja, pelas várias organizações que trazem o know-how e a competência, quer provenham do contexto histórico científico, quer do contexto ativista. Tais placas seriam, claramente, o primeiro passo. Por outro lado, deviam ser oferecidas informações precisas e visitas guiadas.
Atualmente as visitas guiadas a pontos mais críticos da cidade são oferecidas quase às escondidas e procurá-las exige muito tempo. As próprias instituições deviam oferecer visitas guiadas aos seus visitantes. Falta informação e reportagens mais alargadas – sobretudo da parte das próprias instituições – que ofereçam o enquadramento colonial. O Jardim Zoológico Hagenbeck é um bom exemplo disso. Muita gente não sabe que houve aí jardins zoológicos com seres humanos, os africanos e as africanas também não fazem ideia. Uma minha conhecida fez a sua boda no jardim zoológico e só posteriormente veio a saber que lugar era aquele. Ficou absolutamente chocada e horrorizada. E isto são experiências que ninguém gostaria de ter. Há falta de transparência.
Sim, sem dúvida! Por exemplo, as atividades que levamos a cabo com o Fashion Africa Now. Aquilo é puro empoderamento. Nós agimos a partir do ponto de vista negro, africano, e somos a favor da participação, da inclusão e da representação. A plataforma e os eventos não são exclusivamente Safe Spaces, e quem estiver interessado, quem quiser aprender ou informar-se, pode participar.
Sublinho, porém, que o conteúdo é essencialmente da autoria dos BIPoC [3]. Constatamos que existe interesse e necessidade de espaços como este, porque eles não existem. Não existem mesmo! Muitas vezes, é porque falta financiamento para projetos e atores, mas é sobretudo difícil ter acesso a apoios para iniciativas se elas não forem dirigidas por brancos que desenvolvem programas para a sociedade branca dominante. Para o trabalho do empoderamento é preciso que os BIPoC assumam posições de direção com toda a sua competência! É isso que falta nas instituições e é necessário que isso seja reconhecido.
Tradução: Gabriela Fragoso